Lula critica tarifa de Trump e defende autonomia comercial do Brics

Em entrevistas, presidente descarta contato direto com norte-americano, diz que Brasil buscará novos mercados e reforça ideia de comércio em moedas locais
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a defender uma maior autonomia comercial do Brics, bloco que reúne países do Sul Global. Também criticou duramente a decisão dos Estados Unidos de impor uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros. Em entrevistas concedidas na noite de quinta-feira (10) aos jornais da TV Globo e da Record TV, Lula reforçou a disposição do Brasil em buscar alternativas ao dólar e afirmou que a medida adotada pelo governo de Donald Trump é um ataque à soberania.
“O Brics é um fórum que ocupa metade da população mundial e quase 30% do PIB mundial. E 10 países do Brics participam do G20 (incluindo o Brasil), onde o senhor Trump participa (pelos EUA)”, afirmou Lula ao Jornal Nacional. Para ele, é preciso avançar em modelos mais livres e menos dependentes do dólar. “Nós cansamos de ser subordinados ao Norte. Queremos ter independência nas nossas políticas, queremos fazer comércio mais livre, e as coisas estão acontecendo de forma maravilhosa”, disse. “Estamos discutindo, inclusive, a possibilidade de ter uma moeda própria, ou quem sabe com as moedas de cada país a gente fazer comércio sem precisar usar o dólar.”
Na entrevista ao Jornal da Record, o presidente voltou a criticar a dominância do dólar nas relações comerciais. “Eu não sou obrigado a comprar dólar para fazer relação comercial com a Venezuela, com a Bolívia, com o Chile, com a Suécia, com a União Europeia, com a China. A gente pode fazer nas nossas moedas. Por que eu sou obrigado a ficar lastreado pelo dólar, que eu não controlo? Quem tem uma máquina de produzir dólar são os EUA, não nós.”

O presidente lembrou que o Brics é um fórum que ocupa metade da população mundial e quase 30% do PIB global. E que dez países do bloco participam do G20, incluindo o Brasil. Foto: Ricardo Stuckert/PR
Segundo Lula, a postura de Trump deveria ser debatida de maneira diplomática, não imposta de forma unilateral. “Se ele (Trump) tivesse divergência, o correto seria numa reunião do G20 ele levantar o problema, vamos fazer uma discussão civilizada, nos convença, vamos discutir. O que ele não pode é agir como se fosse dono dos outros.”
Questionado sobre a possibilidade de uma conversa direta com o ex-presidente norte-americano, Lula afirmou que não pretende procurá-lo, mas que atuará para proteger os interesses brasileiros com a abertura de novos mercados. “Ele, por exemplo, poderia ter ligado para o Brasil para dizer a medida que ele vai tomar. Ele não mandou nenhuma carta, nós não recebemos carta. Ele publicou no site dele, numa total falta de respeito, que é um comportamento dele com todo mundo. E eu não sou obrigado a aceitar esse comportamento desrespeitoso entre relações de chefe de Estado, de relações humanas.”
IOF será mantido
Em outro momento da entrevista à Record, Lula confirmou que vai manter o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), mesmo após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender os decretos do governo e do Congresso Nacional sobre o tema. Segundo o presidente, eventuais cortes no orçamento — como os R$ 10 bilhões que vêm sendo cogitados — afetariam também as emendas parlamentares, o que deve levar a um novo entendimento com o Congresso.
“O deputado sabe que, se eu tiver que cortar R$ 10 bilhões, eu vou cortar das emendas dele também. Como eles sabem e eu sei, é importante a gente chegar num ponto de acordo. Eu posso antecipar para você: eu vou manter o IOF. Se tiver um item no IOF que esteja errado, a gente tira aquele item, mas o IOF vai continuar.”
Lula também defendeu a prerrogativa do Executivo em editar decretos. “Fazer decreto é responsabilidade do presidente da República. E os parlamentares podem fazer um decreto-lei para eles, se tiver cometido algum erro constitucional, coisa que não cometi.”
Na semana passada, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu os decretos do Executivo que aumentavam o IOF e também a decisão do Congresso que os anulava. Para tentar uma saída negociada, o STF marcou uma audiência de conciliação entre os dois Poderes para o próximo dia 15, em Brasília (DF).
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