O BRICS+ pode ter liderança na agenda climática

O Brasil está liderando importantes marcos internacionais. Depois do G20 em 2024, o país sediará em breve a cúpula do BRICS e a COP30. Em todas elas, a agenda climática está presente. O BRICS+, agora com dez membros plenos, tornou-se mais representativo de todas as regiões do Sul Global, abarcando importantes economias regionais. Assim, o grupo se apresenta como uma plataforma promissora para avançar a cooperação climática, ainda que enfrente desafios para transformar esse potencial em ações concretas.
Desde suas primeiras cúpulas, o BRICS incorporou a agenda climática e energética, mesmo quando o foco era a crise financeira. O grupo defendia acordos multilaterais sobre o clima, a cooperação em eficiência e segurança energética, e o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Esse princípio, essencial para os países do Sul Global, afirma que todos têm a responsabilidade de enfrentar as mudanças climáticas, mas os historicamente mais poluentes — como EUA, Europa e Japão — devem assumir maiores custos financeiros pelas ações de mitigação e adaptação, especialmente em regiões mais vulneráveis, como África, Ásia e América Latina.
Há desafios para o avanço da agenda climática no BRICS+. Como grupo, não há posição unificada nas negociações multilaterais sobre o clima. Individualmente, a maioria dos seus membros ainda não submeteu suas metas climáticas nacionais atualizadas. Na transição energética, a China desponta como potência tecnológica e líder em placas solares, veículos elétricos e turbinas eólicas. Porém, essa transição pode ter impactos negativos nas regiões fornecedoras das matérias-primas minerais, como América Latina e África. O Brasil, por sua vez, oferece uma matriz energética predominantemente renovável, enquanto Rússia, Egito, Irã e Emirados Árabes Unidos têm economias baseadas em petróleo e gás. Esses produtos são também a principal pauta exportadora dos países do grupo, chegando a representar 60-80% das exportações para a China.
Superar tais desafios requer forte liderança política. Em 2015, foi criado o Grupo de Trabalho Ambiental do BRICS (EWG), que se reúne anualmente. O grupo desenvolveu um Plano de Implementação 2023-2027 com um roteiro para aprimorar a coordenação ambiental entre os membros e apoiar sua conformidade com convenções nacionais e internacionais. Em 2024, o EWG lançou o Grupo de Contato sobre Mudança Climática e Desenvolvimento Sustentável (BRICS+ CGCCSD) e iniciou um Diálogo de Alto Nível sobre o tema.
Na presidência brasileira do BRICS+, o trabalho do EWG se concentra em desertificação, degradação da terra e seca; poluição plástica; serviços ecossistêmicos; e liderança coletiva para o clima. Além disso, a proposta central do Brasil é a criação de uma “Agenda de Liderança Climática do BRICS”, com uma Declaração-Quadro dos Líderes sobre Financiamento Climático, medidas para viabilizar a ação climática, cooperação tecnológica com foco em propriedade intelectual, integração entre clima e comércio e definição de princípios comuns para contabilidade de carbono.
O Brasil tem priorizado o tema do financiamento, em conformidade com as prioridades da COP30. Porém, como aumentar o volume de recursos globais para financiamento climático em um contexto de tensões geopolíticas, guerra comercial imposta pelos EUA e nacionalismo econômico crescente? É nesse cenário que o BRICS+ pode vocalizar os objetivos do Sul Global.
É preciso mais coesão e ação conjunta nos espaços multilaterais para acelerar a reforma da arquitetura financeira internacional, ampliar espaço fiscal e viabilizar a liberação de recursos em escala. Isso inclui o direcionamento dos Bancos Multilaterais de Desenvolvimento para o financiamento de infraestrutura verde com prazos longos e condições justas; amortização e redução da dívida dos países mais pobres, que hoje comprometem recursos escassos com o pagamento de juros; e a reforma da estrutura tributária internacional, para conter a evasão fiscal de grandes fortunas e corporações. Essas reformas podem ser impulsionadas pelo BRICS+ e demais países do Sul Global em fóruns como G20, ONU e OCDE.
Em suma, o financiamento climático exige reformas profundas na arquitetura financeira e tributária internacional. Mas não se trata apenas de preencher lacunas: é uma questão de liderança política — quem define prioridades e conduz mudanças. O BRICS+ precisa ter voz e direção nesse processo, de forma coordenada e articulada com os demais países em desenvolvimento. Como ensina a economista Mazzucato, o financiamento climático não deve se orientar apenas à redução de riscos ao setor privado, mas ao alcance de missões públicas transformadoras. Em 2025, a coincidência entre a presidência brasileira do BRICS+ e da a COP30 oferece uma oportunidade única do Brasil e do BRICS+ exercerem uma liderança exemplar, centrada no desenvolvimento sustentável, justo e inclusivo do Sul Global.
CartaCapital